O futuro da crise climática

Estamos indo para o sétimo círculo do inferno?

Michael Lowy, A terra é redonda, 2 de dezembro de 2024

A crise climática já começou. Cada ano é o mais quente jamais registrado. Vemos todos os dias nos jornais: enormes incêndios florestais, inundações e secas, colheitas perdidas, espécies ameaçadas, rios desaparecendo, regiões do planeta onde o aumento das temperaturas torna qualquer atividade impossível, etc. Há cada vez mais vítimas nos quatro cantos do planeta.

A maioria dos humanos sente diretamente na pele o início do aquecimento global em algum momento do ano. Para onde estamos indo? A eleição do negacionista do clima Donald Trump como presidente dos Estados Unidos pode agravar o perigo.

Os cientistas admitem que suas previsões até agora têm sido muito otimistas. O processo de mudanças climáticas avança muito mais rapidamente do que o previsto. Eventos dramáticos correm o risco de acontecer não no final do século, mas nas próximas décadas. Alguns exemplos:

(i) O derretimento das calotas polares e a elevação do nível do mar. Tudo está acelerando, seja na Groenlândia ou na Antártida. E o nível do mar sobe inexoravelmente. Se todo o gelo se desfizer, esta elevação poderá atingir 80 metros. Basta um ou dois metros para que as principais cidades costeiras da civilização humana – Veneza, Amsterdã, Londres, Nova Iorque, Rio de Janeiro, Xangai – desapareçam no mar.

(ii) O derretimento das geleiras dos Alpes, dos Himalaias, etc. Num primeiro momento, isto provocará imensas inundações. Num segundo momento, os grandes rios desaparecerão. Onde encontraremos água para beber?

(iii) O aquecimento global, os incêndios florestais, o desaparecimento dos rios e a seca provocam a desertificação das terras. A agricultura será impossível em grandes extensões de deserto.

(iv) O aumento das temperaturas tornará inabitáveis vastas regiões. Até onde poderá ir este aumento? A partir de qual temperatura a vida humana – e a de muitas outras espécies – estará ameaçada?

Na Divina Comédia, Dante Alighieri descreve a condição dos condenados no 7º Círculo do Inferno da seguinte forma: vagueiam numa vasta extensão de areia árida, ardente, sujeitos a uma chuva de chamas.

É este o futuro que nos espera? Se permitirmos a continuação do business as usual, não podemos excluir esta evolução.

Contudo, ao contrário do que afirmam os chamados “colapsólogos”, o futuro ainda não foi escrito. Os fatalistas que proclamam em voz alta que a sorte está lançada contribuem, com sua inércia, para o desfecho fatal. A luta, a resistência e a mudança de sistema são possíveis. Mas é urgente. Comecemos pela Blockadia: parar, impedir e desmantelar os projetos ecocidas mais evidentes. Ter como horizonte o projeto de mudança de civilização, em ruptura com o sistema capitalista industrial moderno.

Os obstáculos são imensos? O inimigo é poderoso? A consciência do que está em jogo é pouco difundida? Certamente, mas os nossos antepassados enfrentaram desafios semelhantes quando afrontaram a monarquia absoluta, a escravidão ou o fascismo. Como resumiu Bertolt Brecht: os que lutam podem perder, os que não lutam já perderam.

*Michae Löwy é diretor de pesquisa em sociologia no Centre nationale de la recherche scientifique (CNRS). Autor, entre outros livros, de Franz Kafka sonhador insubmisso (Editora Cem Cabeças) [https://amzn.to/3VkOlO1]

Michael Lowy

Michael Löwy é um sociólogo e filósofo marxista franco-brasileiro, nascido em São Paulo em 1938. Reconhecido internacionalmente por seus estudos sobre o pensamento de Marx, o romantismo anticapitalista e a teologia da libertação, Löwy é diretor de pesquisas emérito do Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS), em Paris. Autor de vasta obra traduzida em diversas línguas, articula em seus escritos uma crítica radical ao capitalismo, entrelaçando marxismo, ecossocialismo e resistência cultural.

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