Para qual time o Brasil está jogando: o líder climático ou o rei do petróleo?
O mesmo país que está em Bonn, na Alemanha, liderando as negociações climáticas, leiloou 19 novos blocos exploratórios na foz do Rio Amazonas.
Toya Manchineri, El País, 18 de junho de 2025.
Diante da emergência de um planeta que já ultrapassou o perigoso limiar de 1,5°C de aquecimento, os olhos do mundo estão voltados para a Amazônia, na expectativa de uma COP30 que precisa apresentar resultados urgentes e concretos dez anos após o Acordo de Paris. Mas, nesta semana, o mesmo Brasil que está em Bonn, na Alemanha, liderando as principais negociações climáticas que antecedem a COP30, leiloou 19 novos blocos de exploração petrolífera localizados na foz do Rio Amazonas, contra a nossa vontade, a vontade das comunidades indígenas. Avançar com essa investida petrolífera pode representar um golpe mortal tanto para os povos indígenas que habitam e preservam a Amazônia, quanto para a luta global contra a emergência climática.
O Brasil precisa acordar e decidir: ser um líder climático global ou continuar praticando a velha política econômica de extrair petróleo até a última gota. A exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas é um escândalo ambiental e social que terá graves consequências para os nove países da bacia amazônica e para o resto do mundo. Até o momento, nenhum país amazônico viu progresso para suas florestas e povos com essa atividade econômica. Pelo contrário: o petróleo só trouxe mais pobreza, poluição e morte. Derramamentos e emissões não respeitam fronteiras, e nossos delicados ecossistemas, já se aproximando do ponto sem retorno, podem morrer para sempre.
Nós, povos indígenas, estamos no centro da luta para manter nossas florestas em pé e o clima do planeta estável. E nossa liderança não é retórica: há milênios, manejamos e conservamos as florestas que hoje sustentam o Brasil e o mundo. Temos as respostas que o mundo precisa. Agora, precisamos ser ouvidos e considerados nos processos decisórios, tanto em conferências internacionais que discutem se haverá um futuro possível, incluindo a COP30, quanto em debates sobre empreendimentos que podem nos colocar em uma situação de guerra, como a abertura de campos de petróleo com impactos em nossos territórios.
Além da nossa governança ecológica, o mundo tem muito a aprender com a nossa organização política. No início de junho, líderes dos nove países amazônicos se reuniram em Brasília para uma reunião indígena pré-COP, onde elaboramos soluções transformadoras para tirar a proteção climática da mesa em um momento em que a Amazônia e o clima do planeta estão à beira de um colapso perigoso.
Esta semana, representantes de vários países se reúnem em Bonn para negociações climáticas preparatórias cruciais antes da COP30. E estamos trazendo soluções climáticas para tornar a COP30 eficaz. Essas soluções incluem o reconhecimento e a proteção legal dos territórios indígenas como medida essencial de mitigação, garantindo que essas áreas sejam livres de exploração, o financiamento direto para os povos indígenas em ações de mitigação e adaptação em seus territórios e garantindo sua representação e participação efetivas em todos os espaços de tomada de decisões climáticas. Em última análise, sem nossos territórios indígenas, atualmente ameaçados pelos impactos irreversíveis de atividades como a exploração de petróleo, não há combate possível às mudanças climáticas.
Exigimos que nossas reivindicações sejam amplamente debatidas e consideradas nas negociações pré-COP30 em Bonn, para que juntos possamos realizar o verdadeiro esforço coletivo de que o mundo precisa. Não pode haver impulso global sem nós, os povos indígenas.
A Amazônia há muito é aclamada como a base que sustenta o equilíbrio do planeta, mas essa base está à beira do abismo. O leilão de novos campos de petróleo abrirá estradas que cortarão as florestas e expulsarão pessoas e animais de suas casas. Também trará mais ganância associada à mineração e à expansão desenfreada da fronteira agrícola. E pior: potenciais vazamentos de petróleo que poderiam envenenar permanentemente o equilíbrio de nossas florestas. Além disso, as emissões globais de carbono disparariam.
Nós, povos indígenas da Amazônia brasileira, pedimos ao mundo que apoie nossa luta pelos direitos à terra, contra a extração de petróleo nesta região e que apoie nossas demandas nas decisões climáticas internacionais. Nossa sabedoria ancestral oferece muitas respostas para os problemas do nosso tempo.
O tempo está se esgotando. O Brasil precisa voltar a ser o líder climático de que o mundo precisa urgentemente.
Toya Manchineri é coordenador geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB).